Em sentença proferida nos autos de uma queixa-crime proposta pela advogada Caroline Proner contra o jornalista José Roberto Guzzo, a juíza Suzana Jorge de Mattia Ihara, da 1ª Vara Criminal de Santana, em São Paulo/SP, acolheu a ação penal para condenar Guzzo a quatro meses de prisão em regime aberto, substituída pelo pagamento de 23 salários-mínimos, assim como a arcar com danos morais quantificados em R$ 10 mil.
A autora da medida, esposa do cantor petista Chico Buarque, foi a juízo por pretensa difamação praticada, pelo jornalista, em seu artigo intitulado “Amigos de Lula atacam o erário com a voracidade de um cardume de piranha“, publicado no Estadão de fevereiro de 2023. No texto jornalístico, Guzzo manifestou sua opinião de que, logo após a vitória de Lula nas últimas eleições, Proner foi agraciada com um cargo no BNDES em decorrência do reconhecido vínculo de intimidade entre o planaltino e o artista, seu marido.
Na visão da magistrada, a coluna teria ultrapassado o caráter meramente informativo da imprensa, e incorrido na formulação de juízos depreciativos à imagem de Proner. “Se pretendia informar seus leitores, deveria ter utilizado termos objetivos e técnicos, sem mencionar aquelas expressões depreciativas e dissociadas da qualificação profissional da querelante, com extenso currículo e informações acadêmicas de caráter público”, disse a togada. Um dos robustos elementos de prova invocados pela juíza foi o testemunho de Aloízio Mercadante, atual presidente do Banco por nomeação de Lula, e segundo o qual Proner teria sido “escolhida por seu mérito e sua experiência em âmbito internacional.”
A sentença, a pretexto de resguardar a honra – “também um direito, que integra a dignidade humana” como salientado pela togada –, pretendeu apreciar o que um jornalista pode ou não dizer, quais são as palavras que pode ou não usar. A propósito, o verbo “atacar”, empregado por Guzzo em sua frase “amigos de Lula atacam o erário”, provocou tamanho arrepio na magistrada, que a levou a transcrever todas as suas acepções trazidas no dicionário Houaiss. Ao que parece, a togada enxerga jornalistas, aí incluindo experientes colunistas como Guzzo, como simples “repórteres” de fatos, e, nessa condição, impedidos de levarem ao seu público qualquer outro elemento que fuja minimamente à objetividade rasa de uma descrição passível de ser realizada até por robôs. No universo da doutora de toga, onde residem todas as percepções subjetivas e o espaço opinativo que tornam bons jornalistas tão diferenciados entre si, e ampliam o escopo de um saudável debate público?
Outrossim, ao estipular uma presunção absoluta de seriedade do BNDES e de todos os seus figurões, a juíza fingiu esquecer fatos notórios da nossa história judiciária recente, em particular, a comprovada manipulação do banco público para fins escusos desenhados pelo grupo político reassentado no Planalto. Também pareceu desconhecer o passado não muito recomendável de Lula e do próprio Mercadante, envolvido em denúncias sérias de corrupção e mencionado na planilha da empreiteira Odebrecht. Nosso Judiciário, de cima a baixo, tem vivido de subterfúgios para apagar de nossas memórias todos os comprovados malfeitos dos poderosos da situação, e para punir profissionais do jornalismo que, a exemplo de Guzzo, têm se recusado a compactuar com a farsa ora reinante. Desculpa criminosos; intimida e castiga mensageiros.
Confira a íntegra da sentença:
https://www.migalhas.com.br/arquivos/2024/5/AEFD7A07CD1B80_doc_161340556.pdf
Uma resposta
EU CONCORDO PLENAMENTE COM ESSAS COLOCAÇÕES CITADAS!