O negacionismo de Carmen Lúcia sobre denúncias de irregularidades nas eleições 2024

Ontem (9), a ministra Carmen Lúcia, atual presidente do TSE, se manifestou sobre as fundadas suspeitas de fraude generalizada nas eleições municipais de 2024, em municípios de pequeno e médio portes. Em sua declaração, a togada confundiu dados e demonstrou desconhecimento do cenário sob sua gestão, ao ter afirmado que não teria encontrado “evidências de problemas no pleito”.

No entanto, longe do universo idílico de Carmen Lúcia, a própria justiça eleitoral, o MP e a PF efetuaram prisões, investigações e operações em todo o país, em virtude das transferências em massa de domicílios eleitorais. Segundo as autoridades, pesa a suspeita de que candidatos a prefeituras e a cadeiras em câmaras de vereadores de municípios menores tenham atraído eleitores de cidades vizinhas, mediante a promessa de vantagens em dinheiro e de outras naturezas.

Em 82 cidades, por exemplo, o número de eleitores aumentou entre 20% e 46%, devido à transferência de títulos eleitorais. A par da existência, em vários municípios, de um eleitorado em número maior que o da população – o que já configura robusto indício de fraude! -, houve várias tentativas de transferência de domicílio eleitoral, mediante o uso de comprovantes de residência falsificados.

No entanto, durante sua entrevista de ontem, Carmen Lúcia minimizou a gravidade da situação, e ainda atestou sua ignorância sobre ocorrências registradas. Segundo reportagem da Revista Oeste, no município de Elesbão Veloso (PI), por exemplo, a PF estaria investigando a transferência de 126 títulos eleitorais a partir de comprovantes falsificados, alguns deles emitidos pela companhia estadual de água e esgoto. Já em Minas Gerais, a PF estaria apurando a transferência de cerca de mil títulos de eleitores da região de Governador Valadares para a cidade de Divino das Laranjeiras, de apenas 4 mil habitantes. Em sua declaração, porém, a togada afirmou apenas que as operações “foram basicamente para ver se houve algum tipo de ilícito eleitoral, crime eleitoral ou fatos que poderiam ser criminosos relativos ao uso de recursos, direcionamento de eleitores e candidatos e impedimento de acesso aos territórios.”

Em primeiríssimo lugar, as falas de Carmen Lúcia só vêm corroborar a completa inutilidade da justiça eleitoral, estrutura varguista pretensamente criada para prevenir e combater as vergonhosas fraudes eleitorais durante o período da República Velha, mas que, incapaz de cumprir a função para a qual foi concebida, se tornou apenas um cabide de empregos e benesses estatais. Nos últimos cinco anos, a justiça eleitoral foi mais um órgão aparelhado pelo autoritarismo togado, e empregado sem pudor para a censura a figuras em “desalinho” com o atual regime, para a caça (com “ç”) a mandatos legitimamente conferidos, como foi o caso do ex-deputado Deltan Dallagnol, e para a exclusão, do jogo eleitoral, de políticos de oposição, como ilustrado pela decretação indevida de inelegibilidade do ex-presidente Bolsonaro.

Em matéria de mordaça, aliás, a ministra Carmen Lúcia protagonizou, nas eleições de 22, uma cena oscilante entre a bizarrice ridícula e o horror, ao ter chancelado a censura imposta à produtora Brasil Paralelo, mas “tão somente até a data do segundo turno”. Para a togada, a exibição, na época, de um documentário investigativo teria configurado prova conclusiva de um “ato antidemocrático” (seja lá o que isso signifique). Porém, passados dois anos, a colheita de evidências de práticas efetivamente ilícitas vem a ser menosprezada pela mesma magistrada, em negacionismo explícito, sempre em prol do mito inquestionável da lisura do processo eleitoral brasileiro, de norte a sul, e de leste a oeste de toda a nossa extensão continental.

Como já de hábito no Brasil, nossa elite judiciária nem mais se preocupa em disfarçar as evidências de suas falhas, para dizer o mínimo. Ao passar panos quentes para indícios tão graves apontados pelos investigadores, Carmen Lúcia demonstrou, pelo menos, uma patente desídia no cumprimento das obrigações inerentes ao cargo, o que já seria justificativa suficiente para sua remoção do cargo via impeachment (conforme o artigo 39, inciso 4 da Lei de Impeachment). Porém, em meio aos nossos escombros institucionais, quem se importa com deveres de ofício, ou com a fiscalização destes?

Fonte: Revista Oeste

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